Wellington Alves
Fiscalização surpresa do Tribunal de Contas do Estado de São Paulo (TCE-SP) em hospitais, UPAs e postos de saúde, nesta terça-feira, 25, constatou um dado alarmante – apenas 22% dos equipamentos possui Auto de Vistoria do Corpo de Bombeiros (AVCB). Os locais sem licenciamento são passíveis de interdição.
A falta de AVCB revela um problema crônico na gestão pública. O documento é essencial para garantir melhores condições de segurança e acessibilidade ao público. Os trágicos incêndios da boate Kiss, que matou mais de 200 pessoas em Santa Maria (RS), e no alojamento do Flamengo, com dez mortes, ocorreram pela falta do alvará dos bombeiros.
O TCE-SP mandou 303 agentes averiguar 300 locais públicos, sendo 29 estaduais e 271 administrados por prefeituras. Os fiscais constataram que 20% das unidades não possuem atendimento diferenciado para casos suspeitos de dengue, zika, Chikungunya e febre amarela. No momento da fiscalização, 12% dos médicos estavam ausentes.
Também causou espanto ao TCE-SP que 37% dos locais possuíam equipamentos em desuso (tanto antigos, como novos). Os agentes apontaram ainda que 23% das salas de espera possuem condições inadequadas e metade dos equipamentos de saúde não fazem controle da qualidade da água. Sobre os medicamentos, 11% estavam vencidos.
Na cidade de São Paulo, foram fiscalizados os hospitais de Sapopemba, Pedreira, Vila Alpina, Mandaqui, Taipas, Vila Penteado e Regional Sul. Em Guarulhos, os fiscais verificaram Hospital dos Pimentas, Complexo Hospitalar Padre Bento, PA Parque Alvorada, Hospital Geral de Guarulhos (HGG), Hospital Municipal de Urgências (HMU), PA Maria Dirce, Hospital Municipal da Criança e do Adolescente (HMCA), Maternidade Jesus, Maria e José (JJM) e Hospital Stella Maris.
No Padre Bento foram encontrados equipamentos em desuso e viatura quebrada. No Hospital dos Pimentas havia raio x desmontado e de hemodiálise sem utilização. No HMCA, a folha de ponto de um médico estava assinada no dia 28 de junho. Procuradas, as secretarias de Saúde de Guarulhos e do Estado informaram que não tinha sido notificadas sobre o resultado da fiscalização.
“Falta dinheiro para manutenção dos hospitais”, aponta especialista
Para o gestor de saúde e ex-presidente do Cremesp, João Ladislau, os problemas apontados refletem má gestão em algumas unidades e a falta de investimento do governo federal. Ele conta que os equipamentos em desuso, por exemplo, ocorrem muitas vezes por falta de recursos para manuseio ou manutenção. “Tem cidades que investem 30% do orçamento em saúde, mas o atendimento é ruim. Falta maior participação da União para ajudar os municípios”, analisa.
Para Ladislau, outro problema comum é a falta de estrutura nos prédios. “São estruturas largadas ao tempo que se deterioram sem a manutenção adequada”, diz. Equipamentos complexos, como tomógrafos, por exemplo, deixam de ser utilizados em várias unidades pela falta de rede elétrica adequada.
MPE e Câmaras devem cobrar os prefeitos
Os apontamentos do TCE-SP revelam vários atos de improbidade administrativa, na opinião do mestre em Direito, Marcos Antônio Silva. Ele afirma que os dados poderiam ser utilizados para abertura de inquéritos civis pelo Ministério Público Estadual (MPE) e abertura de comissões especiais de inquérito nas câmaras de vereadores contra os prefeitos das cidades citadas.
É preciso gestão, ainda mais na saúde. É um assunto desagradável a dor das pessoas que não tem o fazer
Marcos Antônio Silva,
mestre em Direito
“É preciso gestão, ainda mais na saúde. É um assunto desagradável a dor das pessoas que não tem o fazer”, afirma. Ele admite que não é viável interditar os hospitais, porém ressalta que é preciso agilidade do poder público para resolver a ausência de Auto de Vistoria do Corpo de Bombeiros nos equipamentos.
Já o urbanista Sérgio Luiz Salles Souza considera que o poder público precisa ter maior rigor com os estabelecimentos administrados por ele. O excesso de unidades sem Auto de Vistoria de Corpo de Bombeiros, segundo o especialista, aponta completo descaso com a população. “É muito perigoso a evacuação de um hospital em caso de incêndio. É preciso rotas de fuga amplas, distâncias menores e chuveiros no teto. São medidas que salvam vidas”, explica.