Wellington Alves – Fotos: Marcos Santos/USP Imagens
A analista financeira Solange Souza (nome fictício) entrou com um pedido de renegociação de suas dívidas no Programa de Apoio ao Superendividado (PAS), da Fundação Procon de São Paulo. Ela teve a vida financeira prejudicada pelo desemprego do marido, além de problemas familiares. Entretanto, não pode fazer novo contrato com a Caixa Econômica Federal, por ter feito empréstimo a menos de um ano.
“O banco público deveria ajudar a população e é justamente quem mais complica a nossa vida”, reclama. A situação de Solange não é uma exceção. No Brasil, mais de 60 milhões de pessoas estão endividadas segundo o SPC Brasil. O número de desempregados e desalentados (que não têm esperança de arranjar trabalho) chega a 28,5 milhões.
Se a situação econômica é complexa, os bancos públicos tem contribuído para que os brasileiros continuem com problemas financeiros. A Caixa Econômica Federal e o Banco do Brasil são os únicos bancos grandes a imporem restrições à renegociação de dívidas pelo PAS. Enquanto a Caixa não renegocia dívidas com menos de um ano, o Banco do Brasil descarta conceder benefícios a quem não está devendo parcelas de empréstimos, mesmo que esteja no vermelho.
Para o economista Agostinho Celso Pascalicchio, da Universidade Presbiteriana Mackenzie, os bancos públicos perdem competitividade ao impor restrições às renegociações. Ele acredita que essa postura pode ser mudada, mas deve demorar alguns anos.
Procurados, Caixa e Banco do Brasil não se posicionaram até a conclusão desta reportagem.
PAS já beneficiou mais de 20 mil pessoas
O Programa de Apoio ao Superendividado proporciona um divisor de água na vida de muitos paulistas. De acordo com o Procon, 20.933 pedidos de renegociação foram efetuados entre outubro de 2012, início do PAS, e maio de 2019. Os consumidores apresentam suas dificuldades financeiras, o Procon tenta intermediar a situação e, normalmente após 50 dias, sai um acordo entre o devedor e os credores.
Segundo o especialista em defesa do consumidor Vinicius Oliveira Silva, nem sempre as empresas querem renegociar dívidas, mas há pessoas que conseguem desconto de mais da metade de seus débitos. “Cerca de 60% das pessoas que nos procuram conseguem acordos”, aponta.
O especialista relata que muitos acordos não são possíveis pela falta de condições financeiras dos superendividados. “Se a pessoa fica desempregada não tem como pagar uma parcela, mesmo que os juros caiam drasticamente”, aponta.
O tempo superendividado significa pessoa que tem dívida superior à sua renda. Silva recomenda que os consumidores consigam gastar, no mês, apenas o que recebem e, também, guardem alguma coisa. “Se tem descontrole tem que parar tudo e voltar a controlar os gastos.”
O calote é a última opção dos consumidores. Silva admite que, muitas vezes, se torna algo inevitável. “Às vezes a pessoa precisa escolher entre pagar o banco ou colocar comida em casa.” No PAS, ele conta que é comum ver pessoas que se endividaram por desemprego, doença ou problemas familiares. “Tem casos que a pessoa não provocou aquela situação.”
Fintechs viram opção por juros menores
Tem crescido no Brasil, nos últimos anos, os bancos digitais, os chamados fintechs. Relatório do BID (Banco Interamericano de Desenvolvimento) aponta que o país é o que mais possui fintechs na América Latina: 380. Elas possuem juros menores do que os estabelecimentos tradicionais. Segundo o economista Agostinho Celso Pascalicchio, da Universidade Presbiteriana Mackenzie, as fintechs forçam os bancos tradicionais a reduzirem as taxas de juros.
“É um direito transferir a dívida ou conseguir crédito no fintech para cobrir o débito”, afirma. A expansão do Cadastro Positivo, que é uma lista com os bons pagadores, também tende, nos próximos anos, a reduzir os juros no Brasil. Neste caso, porém, são beneficiados apenas os que não atrasam as suas dívidas.
Outro lado
A Caixa Econômica Federal, em nota, informou que “disponibiliza aos seus clientes alternativas de tratamento e renegociação de dívidas, tanto por meio de repactuações no próprio contrato, como pausa no pagamento, dilação de prazo, incorporação de dívida ao saldo devedor ou repactuação de taxa, quanto por meio da reestruturação de créditos, provendo inclusive o agrupamento de dívidas.
A Caixa informa que cada produto, de acordo com suas estratégias e observadas as políticas institucionais de crédito responsável e demais legislações vigentes, disponibiliza distintas opções e canais aos clientes que buscam retomar a adimplência de seus pagamentos. E como signatária do Sistema de Autorregulação Bancária – SARB, a Caixa reafirma o seu compromisso com a população brasileira na oferta de produtos e condições compatíveis com a necessidade e a capacidade de pagamento de seus clientes, mantendo nossos canais sempre disponíveis para atendê-los.”
Procurado, o Banco do Brasil não se pronunciou até a conclusão desta edição.
Perguntas sobre o PAS
Quem pode participar?
Pessoa física, maior de idade, legalmente capaz com qualquer renda familiar. A situação de superendividamento é constatada mediante análise dos especialistas do NTS – Núcleo de Tratamento do Superendividamento.
Quais são as dívidas não atendidas no PAS?
Créditos consignados dentro da margem legal consignável, dívidas contraídas por atividades profissionais, indenizações, pensão alimentícia, dívidas fiscais (impostos, multas, taxas etc.), dívidas habitacionais (subsidiados ou não).
Quais dívidas são trabalhadas no PAS?
Dívidas vencidas ou a vencer, independentes do valor total, decorrentes de empréstimos, financiamentos, contratos de crédito ao consumo.
Como recorrer ao PAS?
Agende sua entrevista para inscrição no PAS (Capital) pelo telefone 11 3824 7069. Aos moradores das demais cidades do estado, não usuários de e-mail: procurem pelo Procon Municipal mais próximo para orientações e apoio na efetivação de sua inscrição. Também é possível procurar o PAS, pela internet, no link https://bit.ly/1SvTNcb.
Fonte: Fundação Procon-SP