Em meio à crescente onda de insegurança social surge espaço para teorias radicais como a do alemão Günther Jakobs, denominada “Direito Penal do Inimigo”.
Jakobs defende que o inimigo é um não-cidadão, logo dependendo da natureza do crime praticado terá sua punição antecipada, não tendo direito à ampla defesa e contraditório, devendo ser submetido à leis mais severas.
O direito penal do inimigo pune o autor do delito pelo que ele é ao invés de puni-lo pelo que ele fez. Os adeptos desta teoria primam pela punição do indivíduo em face de sua suposta periculosidade independentemente de restar provada sua culpabilidade, para tanto, sofrerão medidas como quebra de sigilos bancários e fiscais não fundamentados, interceptações telefônicas sem justa causa, prisões cautelares sem fundamentação, etc.
O legislador brasileiro buscando proporcionar sensação de segurança à sociedade que sofre com a crescente violência de criminosos organizados, sutilmente tem incorporado em nossas legislações princípios oriundos do direito penal do inimigo.
Amante do Estado Democrático de Direito não poderia deixar de atender ao convite do gabinete do Eminente Ministro do Superior Tribunal de Justiça Rogério Schietti Cruz para o lançamento da 3ª edição de sua obra Prisão Cautelar – Dramas, Princípios e Alternativas, que ocorreu em 04/10/17 no salão nobre daquela Corte Judicial; primeiramente pela admiração que nutro por sua pessoa, reconhecido sapientíssimo jurista e segundo pela importância de sua obra nos dias atuais, em que ele mesmo ressalta na apresentação que como “(…) magistrado, e sob essa nova condição e com a vivência enriquecida por esses quatro anos de judicatura no Superior Tribunal de Justiça, percebo os mesmos fenômenos e dramas do quotidiano forense. Sem embargo, a alma continua inquieta, à busca de um sistema de justiça menos autoritário e mais racional. E continua a acreditar que o processo penal deve ser um espaço de cidadania, respeito à condição humana, de aprendizado civilizatório e de pacificação social.”
O Ministro Rogério Schietti Cruz assim como seus pares da 6ª Turma do Superior Tribunal de Justiça merecem todo respeito e admiração da comunidade jurídica brasileira, composta por magistrados, promotores, advogados, defensores públicos, delegados de polícia e todos os operadores do direito, por se esforçarem em manter a tradição de uma jurisprudência justa naquela casa de Justiça, mesmo diante de uma sensação popular de que enrijecendo o sistema penal a criminalidade diminuirá.
A jurisprudência da 6ª Turma do Superior Tribunal de Justiça é remansosa no sentido de que a determinação de encarceramento de acusados antes do transitado em julgado deve se dar apenas se presentes e fundamentados os requisitos previstos no art. 312 do Código de Processo Penal.
Não basta para aqueles Ministros a invocação pelo magistrado de aspectos genéricos, relativos à modalidade criminosa ou sua gravidade, ou ainda às expectativas sociais em relação ao Poder Judiciário, decorrentes dos elevados índices de violência urbana.
Diferentemente dos adeptos da teoria de Günther Jakobs, a 6ª Turma do Superior Tribunal de Justiça, especialmente o Ministro doutrinador Rogério Schietti Cruz são recorrentes em decidir que a simples repercussão ou comoção social geradas pelo cometimento do delito não são suficientes para o decreto da custódia preventiva, trazendo assim, segurança jurídica a todos os brasileiros.
As decisões do Ministro Rogério Schietti Cruz tem seguido seu posicionamento doutrinário elevando a prisão cautelar como última ratio, já que o Código de Processo Penal contempla as medidas cautelares substitutivas da prisão. O Ministro deixa hialino seu entendimento no HC nº. 282508/STJ, “(…) é plenamente possível que estejam presentes os motivos ou requisitos que justificariam e tornariam cabível a prisão preventiva, mas, sob a influência do princípio da proporcionalidade e a luz das novas opções fornecidas pelo legislador, deverá valer-se o juiz de uma ou mais das medidas indicadas no artigo 319 do CPP, desde que considere sua opção suficiente e adequada para obter o mesmo resultado – a proteção do bem sob ameaça – de forma menos gravosa.”, “(…) Semelhante opção judicial produzirá o mesmo resultado cautelar – evitar a fuga do réu e o conseqüente prejuízo à aplicação da lei penal – sem a necessidade de suprimir, de modo absoluto, a liberdade do acusado. Além do menor custo pessoal e familiar da medida – pois o não-recolhimento à prisão do réu o poupa, bem assim seus entes mais próximos, de um sofrimento desnecessário – o Estado também se beneficia com essa escolha, porquanto preserva vultosos recursos, humanos e materiais, indispensáveis à manutenção de alguém sob custódia, a par de diminuírem-se os riscos e malefícios inerentes a qualquer encarceramento (lesões corporais, tortura, ou mesmo homicídio eventualmente cometidos por outros presos ou por carcereiros, transmissão de doenças infecto-contagiosas, criminalização do preso, estigmatização etc).”
Não acredito que o enrijecimento das leis penais e o encarceramento arbitrário de acusados adotando teorias radicais e preconceituosas possa diminuir a criminalidade em nosso País, muito pelo contrário, tais práticas, servirão como alavanca propulsora da disseminação de erros judiciários, cometidos por juízes autoritários e despreparados que se valerão da subjetividade das leis para aplicar o direito a seu bel-prazer, independentemente das provas colhidas nos autos do processo.