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Cientistas anunciam quinto caso de cura da AIDS

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Um paciente alemão de 53 anos se tornou o quinto caso de remissão sustentada sem medição do vírus da imunodeficiência humana (HIV), após transplante de medula óssea (TMO) de doador com mutação resistente ao vírus, conforme relataram cientistas na revista Nature. Embora especialistas destaquem que o tratamento é agressivo e não possa ser massificado, receberam o relato com alegria e dizem que ele prova que a cura é possível.

Mais de quatro décadas após a descoberta da síndrome da imunodeficiência humana (aids), cada vez mais cientistas compreendem que a cura do vírus causador da doença será individualizada (caso a caso) e múltipla (com associação de terapias). Enquanto isso não é realidade, prevenção, diagnóstico precoce e tratamento daqueles que vivem com o HIV são as melhores estratégias para lidar com essa epidemia, dizem.

Conforme explica a Organização Mundial da Saúde (OMS), o alvo do HIV é o sistema imunológico. À medida que o vírus destrói e prejudica a função das células imunes, os indivíduos infectados tornam-se gradualmente imunodeficientes e menos competentes para enfrentar infecções e alguns tipos de câncer.

O estágio mais avançado da infecção pelo HIV é a aids, definida, pela OMS como o desenvolvimento de certos tipos de câncer, infecções ou outras manifestações clínicas graves de longo prazo Atualmente, ela é controlada por regimes de tratamento compostos por uma combinação de medicamentos antirretrovirais (que impedem a replicação/multiplicação do vírus no organismo), que permite que pessoas que vivem com HIV tenham vida longa e saudável.

Remissão

O paciente de Düsseldorf, como ficou conhecido, se junta aos pacientes de Berlim, Timothy Ray Brown – primeiro a passar por esse tipo de transplante, em 2007, ele morreu de câncer em 2020 -, e de Londres, o venezuelano Adam Castillejo, além de dois outros anunciados no ano passado, embora alguns cientistas avaliem que seja cedo para comemorar o sucesso do tratamento desses de 2022. Essa palavra “cedo” dá o tom do imbróglio conceitual em considerar um paciente curado do HIV – por isso, assim como nos cânceres, os especialistas preferem tratar como casos de remissão sustentada sem medicamento -, que advém das complexidades e peculiaridades desse vírus.

“No caso do HIV, a partir do momento em que a pessoa se infecta e um pedacinho do material genético do vírus, o DNA pró-viral, se integra no DNA da célula hospedeira por meio da ação da enzima integrase, acabou. O vírus está grudado ali. Ainda que você zere a carga viral da pessoa por meio de tratamento e que a pessoa fique por 20 anos com a carga viral indetectável, se um dia ela parar de tomar remédio aquele fragmentinho de DNA pró-viral vira vírus e volta a ter replicação”, diz o médico infectologista Rico Vasconcelos, pesquisador da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP).

Esse lugar onde o vírus fica escondido e adormecido (em estado de latência) é chamado de reservatório ou santuário. A “verdadeira” cura do HIV, então, precisaria eliminar esses reservatórios, o que parece ter ocorrido nesses cinco casos.

Transplante

O paciente de Düsseldorf, acompanhado há nove anos pelos cientistas, parou de tomar a medição antirretroviral em 2018 e permanece livre do HIV. Mas como isso foi possível? Por meio de um transplante de medula óssea.

O paciente tinha níveis extremamente baixos de HIV, graças à medicação, mas foi diagnosticado com leucemia mielóide aguda e, como outros tratamentos falharam, precisou passar por esse transplante. A grande sacada – e também golpe de sorte – da equipe médica foi encontrar um doador compatível com uma rara mutação (CCR5-delta-32).

Nos cinco anos seguintes ao transplante, a equipe médica continuou a coletar amostras de tecido e sangue do paciente de Düsseldorf. Mas ainda encontrava células imunológicas que reagem especificamente ao HIV, o que sugeria que um reservatório permanecia em algum lugar, além de identificar DNA e RNA do vírus, mas que pareciam não se replicar.

Tratamento

Embora o tratamento pareça promissor, ele não pode ser massificado e escolhido para tratar apenas o HIV. Isso porque, segundo especialistas, é bastante agressivo e tem alta letalidade, além do fato de que encontrar um doador compatível com essa mutação específica não é tarefa fácil. “O transplante de medula mata em média de 35% a 40% das pessoas. Imagina que você vai pegar uma pessoa que tem uma expectativa de vida normal ou até maior do que quem não tem HIV e pode matar. Você só faz isso na hora que você tem um motivo para fazer”, afirma Ricardo Diaz, professor de Infectologia e chefe do Laboratório de Retrovirologia da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp).

Na literatura médica, inclusive, há relatos de pacientes que foram submetidos a ele, mas não conseguiram se livrar do HIV. “Nós não podemos dizer assim ‘pronto, encontramos o jeito de curar todo mundo que vive com HIV’, mas reforça-se um pouquinho mais a ideia de que é possível curar.”

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