Cristiano Medina da Rocha
O Brasil está vivendo momentos de evidente insegurança jurídica. Não precisa ser acadêmico de Direito para se concluir que não é saudável um agente que foi ofendido figurar como juiz da ação a que ele foi vítima. Assim como, aparentemente, sob a égide da Constituição de 88, não foi recepcionado pela nova ordem o sistema judicialiforme, onde uma mesma pessoa poderia acusar e julgar a causa.
No caso envolvendo o ex-deputado federal Daniel Silveira, dos 11 ministros do STF, apenas 4 não foram ofendidos, (Cármen Lúcia, Nunes Marques, Ricardo Lewandowski e Rosa Weber), entretanto, as vítimas o condenaram a 8 anos e 9 meses de reclusão, pelos crimes de coação no curso de um processo judicial, incitação à animosidade entre as Forças Armadas e o STF e por tentativa de impedir o livre exercício dos Poderes da União. Apenas o ministro Nunes Marques votou pela absolvição do ex-deputado. Ele criticou as declarações de Daniel Silveira, mas considerou que elas se tratavam de “bravatas que, de tão absurdas, jamais seriam concretizadas”.
Outro tema polêmico que divide opiniões acadêmicas é o Inquérito das Fake News (4781), instaurado em 14/03/19 pelo então presidente do STF, Dias Toffoli, em razão de supostas ofensas do então PGR Diogo Castor de Mattos, integrante da Lava Jato, ao judiciário. A finalidade do inquérito, é apurar ataques e notícias falsas envolvendo o STF e seus integrantes, sendo, Alexandre de Moraes o relator, sem que tenha sido sorteado. A investigação é fundamentada no Artigo 43 do regimento interno do STF.
O inquérito não foi concluído até os dias atuais e aparentemente viola o sistema acusatório, onde o magistrado está impedido de investigar e acusar. Esse era o entendimento inclusive do então ministro Marco Aurélio, que em seu voto sustentou que “É um inquérito do fim do mundo, sem limites”; tendo criticado o relator pelo fato de não ter sido observado o sistema democrático de distribuição e o sigilo imposto ao procedimento, enfatizando que “Receio muito as coisas misteriosas”.
Marco Aurélio sustentou que “Ministros devem se manter distantes da coleta de provas e formulação da acusação”, entendendo tratar-se de “uma afronta ao sistema acusatório do Brasil”, e que “magistrados não devem instaurar [inquéritos] sem prévia percepção dos órgãos de execução penal”. Entretanto, o inquérito está em tramite, sem a menor previsão de ser finalizado.
Existem inúmeros outros casos polêmicos, recentes, envolvendo o STF que gera insegurança jurídica. Independentemente da gravidade da infração penal ou a quem ela seja dirigida é imprescindível a observância dos princípios do devido processo legal, ampla defesa, contraditório, juiz natural, presunção de inocência, legalidade, proporcionalidade ou razoabilidade, como instrumentos explícitos de defesa dos direitos e garantias fundamentais consagrados na Constituição Federal de 1988.
O Código de Processo Penal é de 1941, e foi inspirado pela ideologia fascista da Itália, tendo como um de seus idealizadores Francisco Campos, Ministro da Justiça de Vargas; período marcado pelo clima repressivo ao comunismo e por habituais violações aos direitos individuais.
Com a promulgação da Constituição de 1988, o processo penal transformou-se em democrático, sendo inaceitável, em nenhuma hipótese, decisões que violem os direitos e garantias fundamentais que visam proteger a dignidade da pessoa humana.