No último dia 31 de outubro, uma luz de esperança surgiu para os filhos e dependentes menores de 18 anos, órfãos em razão do cruel crime de feminicídio. A Lei 14.717/23, institui uma pensão especial para filhos e dependentes menores de 18 anos, órfãos em decorrência de homicídios praticados contra mulheres em razão de gênero.
Ao que parece, o mens legis não apenas almeja fornecer sustento financeiro básico aos dependentes das vítimas, mas surge como um manifesto de empatia, reconhecendo a necessidade de apoio diante das situações desoladoras resultantes do feminicídio.
Ao instituir uma pensão especial destinada aos filhos e dependentes menores de 18 anos que perderam suas mães para esse crime brutal, a lei registra a necessidade urgente de não apenas punir, mas também amparar.
A métrica sensível exigida pela renda familiar per capita, igual ou inferior a 1/4 do salário-mínimo, revela que o legislador optou em amparar as camadas da sociedade mais vulneráveis, buscando amenizar os nefastos reflexos financeiros advindos com a eliminação da figura materna subitamente.
A concessão provisória do benefício, em casos em que há acusações graves de feminicídio, é uma resposta ágil às urgências que envolvem essas tragédias. No entanto, a flexibilidade dessa abordagem levanta questões práticas sobre a implementação eficaz, uma vez que detalhes sobre a entidade responsável pela gestão do benefício permanecem nebulosos.
Além dos méritos proclamados pela lei, surgem algumas incertezas. A falta de clareza na definição dos beneficiários, ao incluir os “dependentes menores de 18 anos” sem critérios específicos, apresenta ambiguidades e a possibilidade de controvérsias futuras.
A cláusula que permite a interrupção imediata do benefício em caso de inocência comprovada do autor, mostra um equilíbrio tênue entre a necessidade de proteção das vulnerabilidades e a preservação da presunção de inocência. É um lembrete de que, mesmo em meio à indignação justificada diante de atos tão atrozes, a justiça deve ser precisa e imparcial.
Ao afirmar que as “despesas decorrentes do disposto nesta Lei serão classificadas na função orçamentária Assistência Social e estarão sujeitas a previsão nas respectivas leis orçamentárias anuais”, a norma parece sussurrar uma promessa vaga, sem oferecer uma solução concreta para a fonte de recursos. Um problema que, se ignorado, pode desencadear uma série de consequências no sistema protetivo, questionando sua sustentabilidade.
A exclusão do benefício para aqueles que, em julgamento definitivo, são considerados condenados a atos infracionais análogos ao feminicídio, é uma medida que visa desestimular o assassinato de mulheres motivado em razão do gênero.
A disposição de que o autor, coautor ou participante do crime represente as crianças para fins de coleta e administração da pensão especial é uma barreira contra possíveis abusos ou manipulações do sistema por parte daqueles envolvidos no ato delitivo.
A não retroatividade dos efeitos da lei pode gerar debates, mas sua aplicação imediata busca garantir socorro às vítimas de feminicídios ocorridos anteriormente, demonstrando uma preocupação real com a situação atual dessas famílias.
A não acumulação do benefício com outros subsídios previdenciários e a reversibilidade da cota em caso de falecimento dos beneficiários demonstram uma preocupação com a efetividade e a justiça na distribuição desse amparo.
No entanto, além da letra fria da legislação, há uma questão mais profunda e complexa: o compromisso coletivo de erradicar a violência de gênero. A Lei é, sem dúvida, um farol ético em meio à escuridão, mas cada um de nós tem a responsabilidade de manter essa chama viva. Que esta lei não seja apenas um texto impresso, mas um eco incessante de um compromisso conjunto pela justiça, pela igualdade e pela erradicação da violência que ceifa vidas e dilacera almas.