Em um país marcado pela beleza de suas paisagens e a calorosidade de seu povo, o Brasil enfrenta, paradoxalmente, um cenário jurídico sombrio: o “Direito Penal do Terror”. Essa expressão, embora possa soar dramática, reflete uma realidade onde o medo e a insegurança são constantes, não apenas pelo crime, mas pela forma como o sistema de justiça penal responde a ele.
O excesso e a espetacularização de punições muitas vezes se sobrepõem à busca por justiça e equidade. Nesse cenário, casos de prisões preventivas que se estendem por períodos indefinidos, julgamentos que parecem mais preocupados em responder ao clamor público e à pressão midiática do que em assegurar a justa aplicação da lei, e a imposição de penas desproporcionais tornam-se sintomas de um mal maior: a insegurança jurídica.
Esta insegurança se infiltra no cotidiano dos cidadãos, gerando um clima de medo e desconfiança que transcende o temor do crime. Famílias veem-se desestruturadas pela ausência de entes queridos detidos sem julgamento definitivo, profissionais têm suas carreiras abruptamente interrompidas, por acusações muitas vezes infundadas, e inúmeras vidas são marcadas pela estigmatização e pelo preconceito decorrentes de uma exposição penal injusta.
A manipulação das leis, com interpretações forçadas ou equivocadas para servir a interesses particulares, representa uma traição aos princípios fundamentais de justiça e igualdade. Quando a lei, que deveria ser o último reduto de proteção contra o arbítrio, torna-se instrumento de injustiça, o tecido social é erodido.
Essa realidade é especialmente preocupante em um contexto onde a luta contra a corrupção e a criminalidade deveria ser pautada pela firmeza da lei aplicada de maneira justa e equitativa. No entanto, o que se observa são episódios em que a justiça parece se dobrar às conveniências do momento, ao invés de se ater aos preceitos de imparcialidade e integridade.
O resultado é um cenário onde a impunidade e a arbitrariedade caminham lado a lado, minando a confiança nas instituições e comprometendo o desenvolvimento social e político do país.
Há dois episódios recentes que merecem atenção especial devido às controvérsias e críticas que suscitaram no âmbito do Direito e da Justiça: o chamado “inquérito do fim do mundo” e a operação “Tempus Veritatis”. O primeiro, assim apelidado pela amplitude quase ilimitada de sua abrangência e pela falta de especificidade nos seus objetivos, causou controvérsias, uma vez que foi iniciado de ofício, pelo STF; contudo, o sistema penal acusatório não autoriza que a condução da investigação penal seja feita pelo Judiciário, afrontando assim o artigo 129-I, II, VII, VIII e § 2º da Constituição, segundo parte da doutrina.
Por sua vez, a operação “Tempus Veritatis”, embora possa ter sido concebida sob a premissa de buscar a verdade e a proteção do Estado Democrático de Direito, tem sido criticada pela forma como aplica o requisito da prisão preventiva. A falta de contemporaneidade — um dos pilares que justificam a necessidade de uma prisão preventiva para garantir a ordem pública, a ordem econômica, a conveniência da instrução criminal ou para assegurar a aplicação da lei penal — coloca em xeque a legitimidade dessas ações.
Quando as prisões preventivas são decretadas sem a demonstração clara de sua necessidade imediata, questiona-se a proporcionalidade e a adequação dessas medidas, além de se alimentar um ambiente de insegurança jurídica e de possível injustiça.
Diante desse cenário, torna-se imperativo refletir sobre o papel do Direito Penal e sobre os caminhos que a sociedade brasileira deve perseguir em busca de um sistema de justiça mais justo, equilibrado e eficaz. A superação do “Direito Penal do Terror” exige mais do que mudanças legislativas ou reformas pontuais; demanda uma revisão profunda de valores, princípios e, sobretudo, de práticas institucionais.