Gil Campos
Dever cumprido. Este é o sentimento do prefeito Guti após oito anos no comando da segunda maior cidade do estado de São Paulo. A partir de 1º de janeiro, Guarulhos estará em outras mãos, do hoje vereador Lucas Sanches (PL).
“Entregaremos uma cidade muito melhor do que aquela que encontramos em 2017. Tenho certeza que alguém que veio à cidade em 2016 e não retornou mais nestes oito anos iria se surpreender com a Guarulhos de hoje”, diz.
Nesta entrevista, o prefeito fala dos principais avanços de sua gestão e “dos sonhos não concretizados”.
Ele ainda abordou o resultado das urnas, nas últimas eleições, que não lhe deixou fazer um sucessor: “Saio satisfeito pelo fato de a esquerda não conseguir mais voltar ao poder em Guarulhos, o que seria uma catástrofe”.
Em tom de despedida, Guti revelou que deve disputar as eleições de 2026 para um cargo no Congresso Nacional – “O mundo político é dinâmico. Até lá decidiremos qual caminho seguiremos”.
Sobre o próximo prefeito, Guti garante que Sanches terá condições de fazer muitas coisas, viabilizadas pela sua gestão que, segundo afirmou, será lembrada pelos guarulhenses de forma positiva. E deseja boa sorte: “Eu como guarulhense, que vivo aqui, que empreendo aqui, espero que ele faça o melhor pela cidade”.
– Depois de dois mandatos no comando da segunda maior cidade do estado de São Paulo, qual Guarulhos o senhor entregará para o prefeito que assumirá no dia 1º de janeiro?
GUTI – Uma cidade muito melhor do que aquela que encontramos em 2017. Tenho certeza que alguém que veio à cidade em 2016 e não retornou mais nestes oito anos iria se surpreender com a Guarulhos de hoje. São muitos avanços nas mais diferentes áreas. Não é ainda a Guarulhos dos meus sonhos, mas é um município com avanços significativos que melhoraram sensivelmente a vida da população.
– Qual a diferença entre o homem e o político Guti, de 2016, quando foi eleito com 481.541 votos aos 31 anos de idade, do homem e o político Guti que, em 2024, aos 39 anos, deixará o Paço Municipal?
GUTI – Eu assumi a Prefeitura com a experiência de dois mandatos como vereador, algo que foi fundamental para que eu entendesse a importância de comandar uma cidade tão grande. Também me preparei muito para assumir o cargo. Logicamente que toda a experiência acumulada nestes oito anos, junto à aprendizagem do dia a dia, me fez amadurecer ainda mais e entender melhor o papel de um gestor público, como todos os ônus e bônus que a função proporciona. Sinto-me hoje bem mais preparado para enfrentar desafios maiores.
– Quais as cinco áreas da administração que o senhor considera mais sensíveis e quais foram os principais avanços?
GUTI – Olha, poderíamos elencar muito mais. A administração é um todo. Você melhora muito o atendimento na saúde, mas a rua em que a pessoa mora ainda tem buracos ou não está pavimentada. Obviamente que o cidadão ainda estará insatisfeito. Com certeza, a Saúde é uma área bastante sensível, onde por mais que você invista – e nós sempre investimos bem mais que o mínimo exigido por lei – sempre haverá algum grau de insatisfação. Guarulhos não tinha esgoto tratado. Eram apenas 2%, números medievais. Hoje estamos chegando a 40%. Não tinha água nas torneiras. Mais de 90% da população sofria com o rodízio. Alguns lugares ficavam até três dias sem água, para ter abastecimento de apenas 12 horas. Hoje tem água todo dia em todos os bairros. Na educação, avançamos muito. Só um exemplo. A cidade tinha apenas 600 alunos em ensino integral. Eram atendidos somente quem tinha ordem judicial. Hoje temos mais de 34 mil em ensino integral. Acabamos com o terceiro turno nas escolas, tinham escolas de lata. Isso acabou.
Na Assistência Social, mais avanços. O Food Truck do Bem, programa itinerante de distribuição de marmitas gratuitas, já passou por 20 bairros e entregou cerca de 190 mil refeições desde 2021. O Restaurante Pague e Leve, instalado na Cidade Industrial Satélite, que começou a operar em maio de 2023, já serviu 83 mil refeições a R$ 1. Fora as três unidades do Restaurante Popular do Bem (Macedo, Parque São Miguel e Taboão), que servem diariamente cerca de 1,5 mil refeições também a um R$ 1 cada.
Também implantamos o Moeda do Bem, inaugurado em maio de 2023, que oferece aos munícipes a possibilidade de trocar resíduos recicláveis por alimentos não perecíveis.
– Especificamente a Saúde, uma área que está sempre no alvo de reclamações, qual o seu maior orgulho no que diz respeito à realização e qual a maior frustração?
GUTI – Avançamos muito. Enfrentamos uma pandemia, em que ninguém no mundo inteiro sabia exatamente o que era melhor fazer. Vivíamos cada momento e tomamos muitas decisões acertadas. Tanto que fui reconhecido como um dos melhores prefeitos do mundo justamente pelas ações adotadas durante a pandemia do coronavírus. Pudemos até ter errado em alguns pontos, mas temos certeza que as ações adotadas por nós pouparam muitas vidas. Isso é motivo de muita satisfação. Não digo frustração, mas lamento pelo fato de que algumas pessoas não reconhecem o esforço que empenhamos para melhorar a saúde da população. Um cidadão não atendido a contento numa unidade de saúde vira manchete dos telejornais. Milhares devidamente atendidos, que saem medicados, com o remédio para tomar, não viram notícia. Mas sabemos que é assim mesmo. Nós tínhamos somente uma UPA. Hoje deixo a cidade com quatro. Reformei todo HMU que antes parecia um hospital de guerra. Fora que deixo dinheiro e projetos para que o próximo governo entregue três hospitais no próximo ano.
– Por falar em frustração, há exato um ano, o senhor disse que uma de suas frustrações foi não ter construído um centro administrativo para acomodar todas as secretarias. Existem outras na sua gestão?
GUTI – Não há frustrações. Há sonhos não concretizados. A questão do centro administrativo é um dos empreendimentos que gostaríamos de ter viabilizado, mas a conjuntura que incluiu os dois anos de pandemia, acabou por impedir que o projeto fosse adiante. Muita gente já se esqueceu do que passamos com o covid. Mas foram dois anos de pandemia, fora as consequências na economia e na administração pública. Posso citar também a conclusão do Hospital Pimentas Bonsucesso, que ainda tinha três andares fechados desde a inauguração. Conseguimos viabilizar os recursos financeiros para a conclusão. Eu gostaria de ter entregue funcionando, mas não foi possível. O próximo governo entregará algo que nós viabilizamos. O mesmo vale para o Hospital da Mulher, cujos recursos destinados pelo Tarcísio [de Freitas, governador de São Paulo] já estão na conta. Basta finalizar. Eu não vou entregar. Mas a população sabe que fomos nós que viabilizamos e que poderá usufruir destes equipamentos a partir do ano que vem.
– Como líder político, podemos considerar o fato de não ter feito um sucessor uma grande decepção? O que aconteceu? Qual sua maior lição neste aspecto?
GUTI – Respeitamos os resultados das urnas. Tínhamos algumas opções. O governador Tarcísio de Freitas fez uma escolha, que nosso grupo político respeitou, até por gratidão por tudo que ele vem fazendo por Guarulhos. Desta forma, optei por seguir sua orientação e apoiar o deputado estadual Jorge Wilson. Saio satisfeito pelo fato de a esquerda não conseguir mais voltar ao poder em Guarulhos, o que seria uma catástrofe. Tenho a sensação de dever cumprido, já que fui o responsável por tirar o PT do poder depois de 16 anos e não deixar eles voltarem ao final de meus dois mandatos.
– Qual nota o senhor dar ao relacionamento de sua gestão com os servidores públicos municipais? Por que?
GUTI – Fui o prefeito que mais proporcionou conquistas aos servidores municipais nos mais diferentes aspectos. Fui responsável pela implantação do Regime Próprio, em que a maioria dos servidores tiveram ganhos significativos tanto salariais como em suas carreiras. Coloquei em dia valores que as gestões passadas deixaram em aberto, principalmente na educação. Garanti ganhos substanciais aos servidores que ganham menos. O vale-alimentação ou vale-refeição hoje é de R$ 1.160,00 para todos os funcionários públicos, um dos maiores pagos por qualquer administração pública de todo o país. Também possibilitamos que nossos servidores aderissem a um PDV (Programa de Desligamento Voluntário), que garantiu ganhos consideráveis a quem dedicou décadas de suas vidas para nosso município.
– Podemos usar o termo “foi fácil” para a relação Executivo e Legislativo nos seus dois mandatos? Quais foram os maiores obstáculos?
GUTI – Sempre tivemos uma relação de respeito entre os poderes. Tivemos uma gestão compartilhada em que sempre ouvimos os parlamentares e procuramos atender às reivindicações de suas bases. Tanto foi assim que percorri cada canto da cidade sempre acompanhado pelos mais diversos parlamentares tanto para ouvir as reivindicações como para entregar as obras solicitadas.
– Ainda sobre o relacionamento com a Câmara, o senhor considera que seu governo sofreu oposição forte e como isto atrapalhou a administração municipal?
GUTI – A oposição existe e sempre existirá. Respeitamos a oposição quando ela é feita com argumentos. Porém, muitos dos ataques que sofremos foram ideológicos. Alguns vereadores da oposição agiram não contra o governo Guti, mas contra a população.
– Hoje, imaginando que o senhor esteja no alto de um prédio contemplando Guarulhos e fazendo uma reflexão do seu governo, o que lhe passa à mente?
GUTI – Entregamos uma cidade muito melhor do que aquela que encontramos.
– Quais desafios o senhor acredita que o futuro prefeito Lucas Sanches irá enfrentar?
GUTI – Ele pegará uma cidade muito melhor do que aquela que pegamos depois de 16 anos de PT. Em vez de uma dívida de R$ 7,4 bilhões, pegará pouco mais de R$ 1 bilhão. Só não zeramos por causa da pandemia. Hoje temos mais de 330 quilômetros de vias recapeadas, água nas torneiras, esgoto tratado a caminho da universalização até 2029. Terá condições de fazer muito mais coisas. E eu como guarulhense, que vivo aqui, que empreendo aqui, espero que ele faça o melhor pela cidade.
– Como o senhor acha que a população vai se lembrar do prefeito Guti no futuro?
GUTI – Tem muitas coisas boas para a população se lembrar de mim. Mas garanto que nenhum guarulhense vai se esquecer do Guti sempre que abrir a torneira e ter água correndo, quando passar pelas ruas recapeadas, quando for levar seu filho na escola em tempo integral. Tem muitos motivos para sempre se lembrar da gente de forma positiva.
– Resumindo toda nossa entrevista em uma só pergunta: dever cumprida?
Com certeza. Fizemos tudo que estava ao nosso alcance e até mais do que prometemos. Dever cumprido.
– Qual seu futuro político?
GUTI – Sigo na vida política. Espero ocupar outros cargos em outros níveis. Devo disputar as eleições de 2026 para um cargo no Congresso Nacional. O mundo político é dinâmico. Até lá decidiremos qual caminho seguiremos.